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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2012 Sharon Kendrick. Todos os direitos reservados.

A PERDIÇÃO DO XEQUE, N.º 1446 - Março 2013

Título original: The Sheikh’s Undoing

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em português em 2013

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

™ ®, Harlequin, logotipo Harlequin e Sabrina são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-2563-5

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Capítulo 1

 

Quando o som do telefone a acordou, Isobel não precisou de ver o nome que aparecia no visor para saber de quem se tratava. Apenas o homem que pensava que tinha o direito a fazer tudo o que queria era capaz de lhe telefonar àquela hora da noite.

Tariq, também conhecido como o príncipe playboy. O príncipe Tariq Kadar al-Hakam, xeque de Khayarzah.

Isobel olhou para o relógio. Às quatro da manhã era demasiado cedo até para ele. Bocejou e pegou no telefone, enquanto se perguntava o que raios estaria Tariq a tramar daquela vez.

Teria surgido algum novo rumor, como costumava acontecer, relacionado com o seu último e audaz projeto empresarial ou simplesmente ter-se-ia envolvido com uma loira, como todas as suas amantes, e queria que Isobel lhe remarcasse as reuniões que tinha na manhã seguinte? Entraria no seu escritório mais tarde, de barba por fazer e com um sorriso orgulhoso nos lábios sensuais? E, como é óbvio, a cheirar a perfume de mulher...

Não seria a primeira vez que acontecia. Isobel franziu o sobrolho e recordou algumas das conquistas sexuais mais famosas de Tariq. Então, recordou a si mesma que ela era apenas a sua assistente pessoal e não uma guardiã da moral.

Os seus amigos perguntavam-lhe se nunca se fartava de ter um chefe que lhe exigia tanto ou se sentia alguma vez a tentação de lhe dizer exatamente o que pensava daquele comportamento machista e escandaloso. A resposta era que sim. Às vezes. No entanto, o salário generoso que lhe pagava detinha toda a desaprovação. Aquela quantia proporcionava-lhe segurança, o tipo de segurança que não se conseguia de outra pessoa. Isobel sabia-o melhor do que ninguém. Não lhe tinha ensinado a sua mãe que a lição mais importante que uma mulher podia aprender era a ser completamente independente dos homens? Os homens podiam partir quando queriam e, como podiam, faziam-no com frequência.

Dispôs-se a atender a chamada.

– Sim?

– Iso... Isobel?

Os sentidos de Isobel ficaram imediatamente em estado de alerta ao escutar a voz profunda do seu chefe. Passava-se alguma coisa. A voz dele parecia... estranha.

Nunca ouvira Tariq a hesitar. Nunca o tinha ouvido a falar de uma maneira que não fosse a própria de um príncipe carismático e seguro de si mesmo, o preferido dos casinos de Londres e de todas as revistas cor-de-rosa. O homem a quem as mulheres não conseguiam resistir, apesar de ser inevitável que ele acabasse por lhes partir o coração.

– Tariq, passa-se alguma coisa? – perguntou-lhe, alarmada.

Apesar da dor, que era tão forte como se mil martelos estivessem a bater-lhe na cabeça, Tariq ouviu a voz familiar da sua assistente, o seu primeiro contacto com a realidade depois do que pareciam horas de caos e confusão. Quase impercetivelmente, deixou escapar um suspiro de alívio e abriu um pouco os olhos. Izzy era a sua tábua de salvação. Izzy cuidaria dele. Viu o teto do quarto, mas teve de fechar os olhos devido à sua brancura ofuscante.

– Um acidente... – murmurou.

– Um acidente? – repetiu Isobel, enquanto se sentava na cama. – Que tipo de acidente? Tariq, onde estás? O que aconteceu?

– Eu...

– Tariq!

Isobel ouviu que alguém dizia a Tariq com voz indignada que não deveria estar a usar o telefone. Então, aquela voz de mulher dirigiu-se a Isobel do outro lado da linha telefónica:

– Estou? Quem fala, por favor?

– O meu nome é Isobel Mulholland e trabalho para o xeque al-Hakam. Importa-se de me dizer o que está a acontecer?

– Sou uma das enfermeiras das Urgências do hospital St. Mark’s de Chislehurst. Receio que o xeque se tenha visto envolvido num acidente de carro.

– Ele está bem? – perguntou Isobel, muito preocupada.

– Receio que neste momento não possa dar-lhe mais informações.

– Está bem – replicou Isobel, certa de que a enfermeira não ia dar-lhe mais detalhes pelo telefone. – Vou já para aí – acrescentou, enquanto saía da cama e desligava a chamada.

Vestiu umas calças de ganga e agarrou no primeiro pulôver que encontrou. Então, calçou umas botas sobre os pés descalços e apanhou o elevador para descer do seu pequeno apartamento de Londres para o estacionamento.

Introduziu o nome do hospital no sistema de navegação e esperou que aparecesse o mapa no ecrã. Parecia que Chislehurst ficava a menos de uma hora dali, certamente menos àquela hora da madrugada.

No entanto, embora não houvesse trânsito, teve de se obrigar a concentrar-se na estrada para não se distrair pelas perguntas que lhe enchiam a cabeça.

O que raios fazia Tariq a conduzir àquela hora da madrugada por aquela zona? Além disso, era muito bom condutor.

Agarrou o volante com força e tentou imaginar o seu chefe poderoso deitado numa cama de hospital, mas não conseguiu. Era um homem muito forte em todos os sentidos. Alto e bonito, o xeque Tariq al-Hakam chamava a atenção em qualquer lugar onde fosse. Os desconhecidos paravam para olhar para ele na rua. As mulheres tentavam dar-lhe os seus números de telefone. Isobel já o vira a acontecer várias vezes.

Os seus traços orgulhosos e um pouco cruéis eram comparados com frequência aos de um anjo caído. Emanava tanta paixão e energia, que era impossível imaginar que algo pudesse inibir essas qualidades sequer por um instante.

E se Tariq estivesse em perigo? O medo apoderou-se de Isobel. O que ia fazer se a sua vida corresse perigo, se ele...?

Nunca pensara que Tariq era mortal. O coração parou-lhe durante um instante. Decidiu que não havia motivo para se deixar levar por pensamentos negativos. Fosse o que fosse, Tariq seguiria em frente, como sempre. Tariq era forte como um leão e Isobel não conseguia imaginar que algo pudesse apagar a força magnífica que emanava.

Começou a cair uma chuva ligeira. Felizmente, estava a chegar ao hospital. Era tão cedo, que o pessoal do turno da manhã ainda não tinha chegado. O edifício parecia muito tranquilo, demasiado, o que serviu para aumentar a sensação de inquietação de Isobel. Sem fazer barulho, dirigiu-se para as Urgências.

Ao chegar ao balcão correspondente, uma enfermeira levantou a cabeça.

– Em que posso ajudá-la?

– Vim... Estou aqui por causa de um paciente. Chama-se Tariq al-Hakam e, pelo que me disseram, viu-se envolvido num acidente automóvel.

– Quem é você? – perguntou-lhe a enfermeira, com o sobrolho franzido.

– Trabalho para ele.

– Receio que não possa dizer-lhe nada. Não é parente dele.

– Não, mas os seus parentes vivem no Médio Oriente – disse. Naquele momento, apercebeu-se de que vestira as calças de ganga mais velhas que tinha e apanhara o cabelo numa trança. A sua aparência era desalinhada e não encaixava com o tipo de pessoa a que se associaria alguém tão importante como Tariq. – Trabalho há cinco anos para o príncipe. Rogo-lhe que me deixe vê-lo. Sou...

Durante um instante, esteve prestes a dizer que era a única pessoa que Tariq tinha. Impossível. Tariq tinha um exército de mulheres a quem podia telefonar, mulheres que tinham mais intimidade com ele do que Isobel alguma vez tivera ou viria a ter.

– Sou a pessoa a quem ele telefonou há aproximadamente uma hora – disse. – Pediu-me ajuda.

A enfermeira olhou-a fixamente e, em seguida, pareceu ter piedade dela.

– Tem um traumatismo craniano. A TAC não mostrou sinal algum de hemorragia, mas vamos deixá-lo algumas horas sob observação para ter a certeza.

– Obrigada – sussurrou Isobel, aliviada. – Posso vê-lo? Seria possível? Apenas por um instante. Por favor...

A enfermeira voltou a olhá-la fixamente e, em seguida, assentiu.

– Está bem, desde que seja só por um instante. Às vezes, um rosto familiar é muito tranquilizador, mas não deve alterá-lo. Entendido?

Isobel dedicou-lhe um sorriso triste.

– Não há perigo disso – respondeu ela. Tariq considerava-a tão excitante como ver tinta a secar.

Com frequência, Tariq descrevera-a como a mulher mais prática e sensata que conhecia, razões pelas quais a tinha contratado. Numa ocasião, Isobel ouvira-o a dizer que era um alívio encontrar uma mulher de menos de trinta anos que não fosse uma distração para ele. Embora aquelas palavras lhe tivessem doído, Isobel tinha aprendido a viver com elas. Sempre soubera o lugar que ocupava na vida de Tariq e não ia tentar mudá-lo. Para o resto, havia uma grande quantidade de candidatas.

Seguiu a enfermeira até um quarto. O que ali viu parou-lhe o coração.

Tariq estava deitado numa cama, coberto por um lençol de algodão branco. Parecia muito grande para aquela cama de hospital. Estava imóvel e o branco imaculado dos lençóis ressaltava a sua pele escura. Inclusive da porta, podia ver o sangue seco que tinha no cabelo preto.

Ao ver o aparentemente indestrutível Tariq com um aspeto tão indefeso, Isobel teve de se conter para não se aproximar rapidamente da cama e acariciar-lhe a face com os dedos. Conseguiu adotar a sua atitude calma e aproximou-se tranquilamente da cama.

Tariq tinha os olhos fechados. Os arcos de ébano das suas pestanas sobressaíam num rosto muito pálido, apesar do tom moreno da sua pele. Isobel já o vira muitas vezes ao longo dos cinco anos que trabalhara para ele, mas nunca o vira com um aspeto tão indefeso. De repente, sentiu vontade de o abraçar e reconfortá-lo.

– Tariq...

Tariq abriu os olhos. Apesar da dor que sentia, foi consciente de algo familiar e, no entanto, muito diferente na mulher que estava ao seu lado. Tratava-se de uma voz que conhecia bem, uma voz que exemplificava a única parte de tranquilidade da sua vida amalucada. Era a voz de Izzy, mas não era igual a antes. Normalmente, era fria, sensata e, às vezes, inclusive reprovadora, mas nunca a tinha escutado com aquele tom suave e trémulo que o surpreendeu.

– Não te preocupes. Não vou morrer – disse. Então, apesar da dor, permitiu-se brincar com a enfermeira, que naquele momento estava a medir-lhe o pulso. – Pois não, enfermeira?

Inexplicavelmente, Isobel sentiu-se zangada com Tariq por ser tão arrogante. Poderia ter morrido e a única coisa que lhe ocorria naquele momento era namoriscar com a enfermeira. Porque tinha desperdiçado um segundo sequer a preocupar-se com ele, quando deveria ter-se dado conta de que era tão indestrutível como uma rocha e com os mesmos sentimentos?

– O que aconteceu? – perguntou-lhe. – Talvez não sejas o condutor mais vagaroso do mundo, mas normalmente tens cuidado – acrescentou. Então, viu que a enfermeira a olhava com desaprovação e recordou as palavras que lhe dissera. – Não tens de me responder. De facto, nem sequer penses nisso. Fica aí deitado e descansa.

Tariq franziu as sobrancelhas pretas e observou-a com incredulidade.

– Normalmente, não és tão atenciosa – comentou, sarcasticamente.

– Bom, não pode dizer-se que estas sejam circunstâncias normais, não te parece?

Isobel esboçou o que esperava que fosse um sorriso tranquilizador, mas não lhe era fácil conter o pânico, sobretudo quando a única coisa que queria era abraçá-lo e dizer-lhe que ia correr tudo bem, apoiar a face de Tariq no seu peito e afundar-lhe os dedos no cabelo sedoso.

O que raios se passava com ela?

– Tens de te limitar a ficar aí deitado e a deixar que as enfermeiras cuidem de ti e verifiquem se estás inteiro.

A voz de Isobel tinha voltado a tremer. Tariq contemplou o rosto da sua secretária. Não recordava alguma vez ter olhado tão atentamente para o rosto de Izzy. No desenrolar normal de um dia, um homem não olhava para uma mulher durante muito tempo a menos que estivesse a planear seduzi-la. Reparou nas sardas que tinha na pele pálida, nos olhos cor de âmbar. Tinha um aspeto suave, bonito... Como uma gatinha. Como se fosse aninhar-se contra ele e ronronar toda a noite.

Abanou a cabeça para afastar aquela alucinação e olhou para ela com desaprovação.

– É preciso muito mais do que um acidente de automóvel ou uma enfermeira para que fique deitado tranquilamente – disse ele, enquanto mexia uma perna com impaciência.

Começara a doer-lhe muito, por isso, dobrou o joelho. O gesto fez com que o lençol lhe deslizasse até à cintura e deixasse uma das coxas a descoberto. Apesar da dor que sentia, não conseguiu evitar sorrir ao ver como a enfermeira e Isobel desviavam o olhar.

– Temos de o tapar melhor – disse-lhe a enfermeira, enquanto voltava a tapá-lo com o lençol.

Isobel ruborizou-se ao dar-se conta de que o seu chefe bonito estava completamente nu por debaixo do lençol. Sentiu um formigamento na pele pela primeira vez, pois, ao contrário das demais mulheres, ela era imune ao encanto sexual de Tariq al-Hakam. O corpo forte e musculado deixava-a completamente fria, tal como o rosto bonito e os olhos escuros. Não gostava dos homens que se sabiam bonitos, que sabiam o efeito que tinham nas mulheres. Os homens que eram capazes de se afastar das mulheres que os amavam sem olhar para trás. De facto, esses eram precisamente os homens que costumava desprezar. Homens como o seu próprio pai. Homens que se despojavam facilmente dos sentimentos e das responsabilidades.

Recompôs-se com uma grande força de vontade e virou-se para a enfermeira.

– O que há a fazer agora? – perguntou-lhe, mas Tariq respondeu antes que a enfermeira tivesse oportunidade de o fazer.

– Agora, vou levantar-me desta maldita cama e tu vais levar-me ao escritório. É isso que há a fazer – replicou.

No entanto, quando tentou levantar-se, uma dor forte fê-lo cair novamente sobre a cama.

– Pode fazer o favor de permanecer deitado, príncipe al-Hakam? – ordenou-lhe a enfermeira. Então, virou-se para Isobel. – Os médicos querem manter o xeque internado para o mantermos sob observação durante vinte e quatro horas.

– Izzy – disse Tariq. Quando ela se virou para ele, viu naqueles olhos pretos a determinação que tão bem conhecia. – Resolve isto, está bem? Não vou ficar neste maldito hospital nem mais um minuto.

– Olha, Tariq – respondeu ela, irritada. – Não estamos a falar de um negócio pelo qual és responsável. Estamos a falar da tua saúde e não és perito nesse campo. Os médicos e as enfermeiras, sim. Garanto-te que não querem manter-te internado porque lhes apetece. De facto, imagino que não deve ser muito divertido ter-te como paciente, por isso, suponho que considerem que é necessário. Se não começares a ouvi-los e a fazer o que dizem, vou-me embora e vou deixar-te sozinho para que te entendas com eles.

Produziu-se um silêncio tenso em que os olhos de Tariq se semicerraram com uma expressão furiosa.

– Mas tenho reuniões...

– Sei precisamente quais são as reuniões que tens – interrompeu-o ela. – Eu organizo-te a agenda, não é? Resolverei tudo quando chegar ao escritório para que não tenhas de te preocupar com nada. Queres...? – interrompeu-se enquanto olhava para o lençol branco que cobria o peito largo de Tariq. – Queres que te traga um pijama?

– Um pijama? – perguntou ele, com um sorriso zombador. – Por acaso, achas que sou o tipo de homem que dorme de pijama, Izzy?

Inexplicavelmente, o coração de Isobel começou a pulsar de excitação, uma reação que a perturbou profundamente. Ter-se-ia ele dado conta?

– Nunca pensei no que usas para dormir – replicou ela, – mas vou encará-lo como um não. Queres mais alguma coisa?

– Podes trazer-me roupa lavada e uma máquina de barbear?

– É óbvio. E, assim que os médicos te derem alta, virei buscar-te. Parece-te bem?

– Não creio que na realidade queiras que te responda, pois não? – respondeu ele, depois de uma pausa. Então, fechou os olhos. Uma grande fadiga apoderara-se dele e deixara-o muito debilitado. A última coisa que queria era que a sua assistente o visse assim. – Vai-te embora, Izzy.

Isobel saiu silenciosamente do quarto e continuou a andar até sair do edifício. Já se fizera de dia. A luz deliciosa daquele dia de primavera levou-a a respirar fundo. Tariq estava vivo. Isso era o mais importante. Não obstante, não tinha gostado de o ver ali, sozinho.